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Sobre duas rodas

Minha nova mania é andar de bicicleta. "Não teve infância?", me perguntam. Tive. Mas, em casa de nove filhos, duas bicicletas era tudo que tínhamos – uma para os quatro maiores, outra para os cinco menores. Meu lugar era no segundo grupo. Agora, mais velhinha, descobri os prazeres de pedalar. Comecei pela ergométrica, paradinha ali, mais segura, mas logo adquiri a minha, do tamanho adequado a minha baixa estatura, tudo nos conformes.
O roteiro mais interessante perto de casa é o Parque da Cidade, que oferece todas as condições para o ciclista se divertir e exercitar com mínimos riscos. Isso no meio da semana, porque aos sábados e domingos, quando o delicioso destino de lazer de tanta gente se enche de crianças e adultos que não sabem que aquela faixa lateral destina-se às duas rodas, aí são demais os perigos desta vida. Atravessam na sua frente, passeiam pela ciclovia, param pra conversar por ali, velocípedes, carrinhos de sorvete, skates e patins surgem do nada, ameaçando o já delicado equilíbrio.
Pedalar é uma delícia não apenas para fortalecer a musculatura e desenvolver o preparo físico, aumentando o fôlego e a resistência. Ajuda também no exercício – cada vez mais raro – de pensar. Não gosto de levar som de ouvido. Prefiro dar voz aos passarinhos, escutar o vento, o chiado das folhagens, a aproximação de humanos. E assim dar espaço ao pensamento, à lembrança, à fluência das idéias. Na vida de corre-corre, como faz falta pensar!
Numa cidade como Brasília, de características planas, fazem falta não apenas ciclovias, como políticas para as bicicletas. Há, mas são tímidas, campanhas de segurança no trânsito. Os grupos de ciclistas de Brasília, encabeçados pelo Pedal Noturno, Rebas do Cerrado, Rodas da Paz, Dá Pedal e outros, difundem a necessidade de equipamento de segurança e respeito no trânsito, mas ainda se vêem em maioria os que pedalam sem capacete, com roupa escura ou sem as fitas reflexivas que permitem que sejam vistos pelos motoristas, os que pedalam na contramão, na faixa de pedestre, os que não param no sinal.
Se o Rio de Janeiro consegue ter uma linda ciclovia ao longo de sua orla na Zona Sul, por que, aos 48 anos, Brasília ainda não projetou uma que a atravessasse de norte a sul e outra de leste a oeste. Está certo que há no Paranoá e em São Sebastião, mas outras poderiam ladear as principais vias do DF, de modo a permitir que ciclistas se deslocassem, em lazer ou para o serviço e a escola, sem morrer no caminho. (Clara Arreguy)

Publicado no Correio Braziliense em 28/08/08

Postado por Dá Pedal, sexta-feira, agosto 29, 2008.


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